Ator, escritor, realizador e produtor, Colman Domingo acabou de se estrear numa nomeação para os Óscares. O ator, de 54 anos, nascido em Filadélfia, nos EUA, disputa a categoria de Melhor Ator pelo seu papel como o ativista gay dos direitos civis, Bayard Rustin, no filme “Rustin”.
À revista Variety, Domingo contou como foi o momento em que soube que tinha sido nomeado. “Acordei cedo, porque o meu corpo sabia que dia era e resolvi organizar o meu armário às 5h da manhã. O meu marido [o produtor de cinema Raúl Domingo com quem é casado desde 2014] estava a assistir ao feed e quando disseram o meu nome, ele literalmente atirou-se para o chão. Chorámos um pouco juntos. Isto é algo inacreditável para alguém que faz este trabalho há três décadas.”
O ator acredita que, apesar de ter sido apenas a segunda vez que a Academia nomeia um ator assumidamente gay, a interpretar um papel gay, esta nomeação pode representar uma mudança. “A maneira como consegui ver-me nesta indústria é que posso representar qualquer coisa, e isso não é limitado pela minha sexualidade. As pessoas veem-me como eu me vejo, e ser capaz de interpretar todos estes
diferentes tipos de homens, com experiências muito diferentes... Sou um forte exemplo disso e há muito mais pessoas que poderão vir depois de mim”, diz Domingo, fazendo também referência à sua personagem Albert “Mister” Johnson, no filme “A Cor Púrpura”, tão díspar de Rustin, e com o qual espera mostrar “que homens gays podem desempenhar papéis tão díspares”.
No entanto, Domingo não esconde que interpretar Rustin foi algo sonhado e com sabor a destino. O seu primeiro contacto com o legado do pioneiro dos direitos civis Bayard Rustin foi passageiro. Estava no primeiro ano de faculdade e a histórica Marcha de 1963, em Washington, por empregos e liberdade, não passava de uma nota de rodapé num dos seus livros, como uma parte da história minimizada e silenciada. Só anos depois, na década de 90, ao ler o guião da peça “Civil Sex”, de Brian Freeman, é que Domingo aprenderia o quão impactante Bayard Rustin foi. “Fiquei incrédulo. Este homem, abertamente gay, organizou a marcha sobre Washington e inspirou Martin Luther King a conhecer a resistência passiva e os ensinamentos de Gandhi... ‘Como é que eu não sabia isto?’ Simplesmente, senti-me enganado por toda a minha educação”, conta à Variety. Quando recebeu o convite sentiu a responsabilidade de o retratar com sinceridade: “Sinto que Bayard está no meu ombro há anos, a dizer: ‘Tu é que vais contar a minha história.’ E eu sabia que tinha tudo o que era preciso e todas as ferramentas para dar a este homem toda a sua humanidade, o seu humor, a sua sexualidade, a alegria. Não tenho medo de entrar em nenhum dos seus espaços.” Esse mesmo sentimento ganhou ainda mais importância porque fazia eco de outras pessoas que, ao longo de décadas, encontravam muitas semelhanças “por sermos ambos negros, gays, canhotos, termos a mesma altura, o mesmo peso”...
O ator também sente outra conexão mais profunda com Rustin, a quem credita o facto de o ter colocado “no caminho da autenticidade”. Domingo sabe como as pessoas negras e queer, e as suas histórias, são frequentemente marginalizadas: “Normalmente, nunca estamos no centro de uma história, mas sei que muita gente está a torcer por mim e também, de certa forma, a dizer: ‘Colman, tens que fazer isto bem ou as nossas histórias não serão contadas novamente.’ Precisamos mostrar que as maiores conquistas deste país foram alcançadas não apenas pelas pessoas que a história escolheu reconhecer, mas também por muitas que a história escolheu não reconhecer, pessoas de cor e de todas as sexualidades e identidades de género.”
Apesar dos 30 anos de carreira na representação, Colman Domingo afirma que existe um paralelismo com o jornalismo. “A cada projeto que faço, sinto que sou um incubador, um zelador da nossa história. Ainda é a mesma centelha que tive quando quis ser jornalista, e quis ir a lugares devastados pela guerra e documentar a nossa humanidade e o que se passa no mundo, para partilhar isso com as pessoas.”
A nomeação ao Óscar por “Rustin” marca um momento importante da sua carreira, mas Domingo já olha para os próximos grandes projetos, uma vez que se prepara para vestir a pele de Joe Jackson, o polémico agente e pai de Michael Jackson, no filme biográfico “Michael”, bem como do vocalista e pianista de jazz Nat King Cole num musical em que coescreveu o guião, e que vai marcar a sua estreia na realização.