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Nacional
Alta Costura por Filipa Guimarães: 'Vaias públicas e insultos online: o que é pior?'
Alta Costura na Lux por Filipa Guimarães, jornalista e escritora Foto: Carlos Ramos
Redação Lux em 10 de Dezembro de 2020 às 18:00

Vaias públicas e insultos online: o que é pior? por Filipa Guimarães

Às vezes, ponho-me a pensar se a fama não torna as pessoas um bocado extra-terrestres. Ou, dito de uma forma mais ligeira, se de tanto estarem expostas ao olhar (e à opinião) dos outros, não ficarão com uma ideia errada de si próprias. Pensei nisto a propósito de coisas completamente distintas. Por um lado, a morte do “Deus” Diego Maradona e, por outro, a entrevista de Cristina Ferreira no telejornal da TVI. Antes de tudo, devo dizer que só devo ter visto o Maradona a jogar duas vezes na vida. Sabia da lenda, das piadas eternas sobre a sua dependência de cocaína. Foi ao ver um documentário excelente sobre a vida dele, que percebi como é que foi engolido pela droga. “El Pibe” foi falível, como é apanágio dos humanos. O “Deus”, o mais do que tudo, o que teve tudo, teve também um vazio, que procurou compensar com vícios. Com Cristina Ferreira – que, a ter algum vício, será só o do trabalho –, também senti que o excesso de fama lhe podia estar a começar a fazer mal. Espero que não, que não lhe desejo mal. Não tenho nada contra ela, a não ser ter achado mal feita aquela saída da SIC, mas sobre isso as opiniões também divergem. O que acho um exagero é estar a levar-se (e a ser levada) tão a sério por causa do chamado cyberbulling. O título do livro, “Pra cima de puta” não me choca nada. A fotografia da capa também é só mais uma, entre a dezenas que vemos nas bancas de jornais e às quais ligamos o que queremos. Quase que dá para “cheirar” as que são maldosas. Não tenciono comprar o livro, porque não me interessa o inventário de insultos que lhe são dirigidos. Por ordem alfabética, como consta do índice. Não fossem os textos sobre o tema, no final, pouco haveria a aprender. Repetir insultos tem algum efeito pedagógico ou é apenas auto-defesa? É que se formos por esse critério, cada famoso pode escrever um livro sobre este fenómeno. É assim que se protegem os adolescentes? Porque são eles os mais vulneráveis e em fase de crescimento. Uma mulher como ela, que rivaliza em popularidade com pessoas como Marcelo Rebelo de Sousa ou Cristiano Ronaldo, liga tanto aos comentários que fazem dela nas redes sociais? Mas então porque é que, pura e simplesmente, não fecha as suas contas? Ou não dá conselhos a outros famosos? Acredito piamente que seja desagradável e triste ler tanto insulto mas... ninguém lhe diz que não é para ligar? Ao contrário de Maradona, Cristina não ouviu estádios inteiros a vaiá-la. O insulto cobarde é horroroso e um crime contra a honra. Ela sabe que também usou (e melhor do que ninguém) as redes sociais para se promover profissionalmente como apresentadora e empresária. Tem à volta de 1,5 milhões de seguidores! Qual é o espanto ao ouvir coisas, como diz a própria, “Pra cima de Puta”? Não estou a querer dizer, repito, que ache bem, claro que não acho. Mas não seria muito mais didático (já que foi dito na própria entrevista que as receitas do livro eram para combater o cyberbulling) passar para outra fase e deixar de estar nas redes sociais? É que a entrevista no telejornal da TVI não era só sobre cyberbulling, também era uma resposta a uma capa da revista “Sábado”, que a “vendia” como uma pessoa cheia de defeitos. Cristina pode estar com a melhor das intenções, mas na televisão, como na política, o que parece é. E o que é que pareceu? Pareceu que foi ao telejornal em auto-defesa. Como directora de entretenimento e ficção e também como accionista, não concordo que use o espaço jornalístico para falar do seu caso. Mesmo com uma peça de enquadramento com uma psicóloga, só foram adultos famosos a falarem. Acho que a apresentadora tem de se posicionar de outra forma. Já chega o livro. Que se promovam, então, outras iniciativas públicas mais abrangentes. Espero que o próximo livro se chame “Pra lá disto tudo”.

(Crónica publicada na revista Lux 1075 de 7 de dezembro)

Este texto foi escrito ao abrigo do novo Acordo Ortográfico
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