PUB
PUB
Nacional
Alta Costura por Filipa Guimarães: 'A Vindima, o Arquiteto e Fátima Campos Ferreira'
Alta Costura na Lux por Filipa Guimarães, jornalista e escritora Foto: Carlos Ramos
Redação Lux em 12 de Novembro de 2020 às 18:00

 'A Vindima, o Arquiteto e Fátima Campos Ferreira' por Filipa Guimarães

É preciso ter-se muito jogo de cintura para se fazer uma entrevista num cenário mais informal, como é o de uma vindima. Não é porque o entrevistado está de camisa e chapéu que é obrigatório dar-se à conversa um tom pitoresco ou castiço, como foi o usado pela treinada entrevistadora Fátima Campos Ferreira com Eduardo Souto de Moura. Quem assistiu, sentiu que um pouco mais de contenção lhe ficaria bem. Porém, o resultado final raiou o cómico. Por um lado, porque este arquiteto tem sempre coisas interessantes para dizer, de forma bem-disposta, uma filosofia da vida que vai bem além da arquitetura. Diz as “verdades” que uns pensam mas não dizem. Por outro lado, Fátima Campos Ferreira não teve presença de espírito para aproveitar as deixas que ele lhe ia dando. Num jeito, quanto a mim, demasiado descontraído (que é difícil de conseguir, mas não impossível), não chega pôr um chapéu de palha para entrar num registo de quase colegas de escola. Mesmo que tenham andado, não se entrevista ninguém com as primeiras perguntas que surgem. Às tantas, Eduardo Souto de Moura diz que “detesta casais felizes”. Fátima Campos Ferreira, nem sequer faz uma reflexão ou uma reformulação mais aprofundada. Salta-lhe logo um apressado e frugal “porquê?”, como se esta fosse uma entrevista para crianças. “Porque são patetas”, responde o entrevistado, ironicamente. Sem nexo, a entrevistadora diz: “E então porque gosta tanto de se rir?” Sabemos que uma coisa não tem, necessariamente, a ver com a outra. Porém, o arquiteto, que parece estar habituado a ir do nada para alguma coisa, responde-lhe, como um mestre: “Porque tem alternância!” Na divertida e interessante explicação, Souto de Moura compara o casamento ao andamento de um carro. É preciso meter a embraiagem, para não se ir abaixo. É então que a entrevistadora riposta, com um toque de cotovelo: “Mete-se a embraiagem, no casamento?!” Não fosse a bonomia do entrevistado, um bom conversador, ainda podia troçar com ela, porque Fátima a conduzir entrevista, não a aprimorou como uma jornalista, mas mais como uma “entertainer”. Foi um programa sem fio condutor: “Onde é que vamos dar?” ou “o que é uma casa?”. De qualquer dos modos, valeu a pena ver, porque era o Souto de Moura. Porém, nem todos os entrevistados se podem abordar com este estilo tão relaxado.

(Crónica publicada na revista Lux 1069 de 9 de novembro)

Este texto foi escrito ao abrigo do novo Acordo Ortográfico
Comentários

PUB
pub
PUB
Outros títulos desta secção