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Nacional
Alta Costura por Filipa Guimarães: 'As minhas sapatilhas no canal do Suez?'
Alta Costura na Lux por Filipa Guimarães, jornalista e escritora Foto: Carlos Ramos
Redação Lux em 15 de Abril de 2021 às 18:00

AS MINHAS SAPATILHAS NO CANAL DO SUEZ? por Filipa Guimarães

Há mais de três semanas encomendei umas sapatilhas em saldo. Fui seduzida pelos “últimos dias de saldos” e pela entrega em 24 horas. Eram boas e paguei antecipadamente, pelo cartão desse hipermercado. Recebi logo o agradecimento pela encomenda, automático. Quem compra online já deve ter percebido que me refiro ao hipermercado El Corte Inglés, que sempre teve mais departamentos abertos do que os seus congéneres portugueses. Compreensiva com a pandemia, esperei uns dias. Com medo de que as ditas cujas fossem extraviadas, esquecidas ou tivesse havido alguma confusão, contactei os serviços de apoio ao cliente. Por e-mail, pois já me cansam as longas esperas ao telefone, ter que repetir nome, morada e dados sem-fim. Na primeira resposta, explicaram-me que iria recebê-las em breve e que estavam “a caminho”. Nestes tempos, “estar a caminho” é a coisa mais vaga que pode haver. O “dia seguinte” deve ser o que eles quiserem. Já perturbada com o atraso, voltei a contactar os serviços para cancelar o pedido e a devolução não só da quantia adiantada como da taxa de entrega. Do outro lado, disseram-me que não conseguiam contactar com a transportadora. Pelos vistos, o serviço de transporte não pertence a este estabelecimento comercial, é contratado por eles. Como tal – vá uma pessoa perceber isto –, não podiam devolver a quantia. Esperei mais uma semana, na esperança de que as duas empresas se entendessem entre elas. Mas nada, tudo na mesma como a lesma. Nem sapatilhas nem satisfações. Como se eu pudesse e estivesse disposta a aguardar ad eternum por um artigo que está também disponível online, sem promessa de entregas relâmpago. Durante este período, o navio Evergreen encalhou no Canal do Suez e, com ele, encalhou muita carga vinda de outras paragens. Será que o meu par de sapatilhas faria parte das mercadorias paradas? Era altamente improvável. Ou será que não? Com este atraso, já acreditava em tudo. Até na venda de artigos sem stock. Foi então que outra pessoa do departamento me questionou para que eu confirmasse que vivia em Angra do Heroísmo. Nessa altura, achei que estavam a gozar comigo e perguntei como nem sequer se tinham dado ao trabalho de ir verificar a minha morada. E rematei dizendo que já não queria saber dos problemas de descoordenação dos serviços e que me devolvessem de imediato a quantia. Ainda não a recebi, mas não pretendo largar o osso. Não tenho de pagar a falta de organização de uma empresa que continua a vender coisas para entregar no dia seguinte e depois não cumpre. Se o dinheiro não me for rapidamente devolvido, vão ter problemas comigo. Por fim, ainda recebi dois e-mails em espanhol. Nem uma palavra sobre a minha encomenda. Os danos causados não são grandes, mas isso não me impede de procurar todos os mecanismos disponíveis para que não façam de mim parva. Dá trabalho e requer paciência, tempo e (quem sabe) até custos. Mas, como se diz em bom português: “Isto não fica assim!”

Crónica publicada na Lux 1093 de 12 de abril

 

Este texto foi escrito ao abrigo do novo Acordo Ortográfico
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