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Nacional
Vasco Pereira em 28 de Outubro de 2024 às 10:58
Marco Paulo: Recorde a última grande entrevista do cantor à Lux

Entrevista exclusiva de Marco Paulo à Lux em Abril de 2024

A vida coloca-o à prova de diversas maneiras, mas Marco Paulo recusa-se a perder o sorriso e a vontade de ser feliz. “As pessoas acham que sou um eterno menino”, diz, bem-disposto, mostrando que gosta de retribuir o carinho que tem recebido ao longo de uma carreira de sucesso.

“Querem que sorria, que seja alegre, que cante, que não deixe de fazer o programa... Incentivam-me muito.” Uma atitude positiva que diz aplicar no seu dia a dia, numa altura em que volta a lutar contra um problema oncológico, agora no fígado. “Nunca me veio à cabeça que seria o fim da minha vida, com estes quatro cancros que já tive. Pensei sempre que ia ser tudo ultrapassado e penso, ainda hoje, que vou fazer muita coisa”, afirma.

Em conversa com a Lux, que o acompanhou nos jardins e em lugares especiais da sua casa, o artista fala sobre a sua saúde e da vontade de voltar aos palcos, e revela ainda um novo projeto que pretende criar em Mourão, a terra onde tudo começou. “No Alentejo, era uma criança que brincava no campo e que nunca pensou que um dia seria condecorado pelo Presidente da República... Mas esse menino aprendeu muito! Foi vivendo até chegar aqui”, lembra Marco Paulo.

Lux – Está a fazer quimioterapia. Como se tem sentido?
Marco Paulo – Estou a sentir-me melhor do que quando foi com o problema do pulmão. A quimioterapia do pulmão foi um bocadinho forte, mas consegui que estagnasse. Agora, estou a receber uma quimio mais leve e então não tenho muitos sintomas. Os níveis tumorais, felizmente, baixaram muito!

Lux – Ter estas notícias é muito motivador para pensar que, mais uma vez, vai superar a doença?
M.P. – Claro! Tenho a minha fé, toda a gente sabe, mas só a minha fé não quer dizer tudo. Rezo muito a Nossa Senhora e a Deus, para que me ajude a mim e a quem possa estar a passar pela mesma situação, mas depois tenho que confiar naqueles que nos foram postos na vida por Deus, que são os médicos. Tenho que confiar neles, e tudo aquilo que me disserem tenho que fazer.

Lux – O Marco estava a lutar contra um cancro no pulmão...
M.P. – Tive um cancro na mama, que foi extraído, mais tarde, uma metástese passou para o pulmão, que agora está estacionário. Já não tomo quimio para esse problema, mas como o pulmão direito foi mexido tenho que ter um certo cuidado. Não me posso cansar. Estou a trabalhar com dois pulmões, mas um não está a 100%.

Lux – O problema no pulmão está curado?
M.P. – Não posso dizer que estou curado, porque não me foi dito isso. Foi-me dito que a situação estava resolvida, mas no dia em que me foi dada a informação de que o problema no pulmão estava estacionário, tive que fazer um exame de rotina, e nesse exame apareceram metástases no fígado. Estou a fazer este tratamento para o fígado. É nisso que agora estamos focados, em curar.

Lux – O tratamento é em comprimidos?
M.P. – Não. Fiz em comprimidos, mas não resultou. Tive que voltar à quimioterapia intravenosa.

Lux – E que recomendações é que lhe dão?
M.P. – Faço a minha vida normalmente. Posso conduzir, não posso é fazer grandes viagens. Pedem-me muito para fazer repouso, mas faço uma vida normal.

Lux – Como é a sua rotina?
M.P. – Estou em casa, quando tenho músicas e letras para decorar, decoro... Tenho saudades de voltar a ensaiar e de ouvir os aplausos, mas em primeiro lugar está a minha saúde, e acho que devo esperar para quando estiver a 100%. Não é fácil! Ainda há uns dias disse ao meu compadre que tenho saudades de cantar e de fazer um concerto... Ele disse-me “se te apetece, faz”. Mas sei que não o posso fazer já. De resto, estou por aqui. Tenho este espaço todo onde me entretenho com os meus animais. À terça e à quarta, entretenho-me a fazer o meu trabalho, que é muito bom. Recebo muita gente! Isso é muito gratificante, porque, nesses dias, as pessoas além de virem assistir ao programa vêm também para estar comigo, para me trazerem flores, prendas, para conversarmos e tirarmos fotografias...

Lux – Fala muito na fé que o tem acompanhado ao longo da vida...
M.P. – Desde os 18 anos, quando fui pela primeira vez a Fátima e fiquei rendido.

Lux – Essa fé nunca é abalada ou questionada por passar por problemas de saúde?
M.P. – Não. Continuo a ter a minha fé, a dirigir-me a Nossa Senhora e a Deus. Sempre que posso vou visitá-Los, embora em qualquer canto da minha casa posso falar com Eles. Agradeço-Lhes muito pela ajuda que me dão e àqueles que precisam como eu. É esperar. Vivo muito um dia de cada vez.

Lux – Aprendeu a olhar para a vida desta forma? Em que cada dia é um novo recomeço?
M.P. – Cada dia é um novo recomeço, é verdade... Porque vivi muitos anos completamente obcecado pela minha carreira de artista, pelos meus discos, pelos concertos, pelas minhas fãs... Vivi intensamente! Não tinha horas para almoçar, para jantar, para dormir, para descansar! Agora acho que posso continuar a fazer as mesmas coisas, mas um dia de cada vez. Se soubesse que ficava cá eternamente, talvez fizesse a curva da minha vida diferente. Como não faço tenções de ficar cá, é viver um dia de cada vez e tentar vivê-lo o melhor possível, com problemas (que qualquer pessoa tem) e com coisas boas.

Lux – Um dia de cada vez, mas olhando para a frente?
M.P. – Olhando para a frente, claro! Ainda canto. No ano passado, saiu a “Casa Amarela” e espero ainda gravar um ou dois discos. Estou sempre com a convicção de que vou conseguir fazê-los. Nunca me veio à cabeça que seria o fim da minha vida, com estes quatro cancros que já tive. Pensei sempre que ia ser tudo ultrapassado e penso, ainda hoje, que vou fazer muita coisa. Temos que ter confiança e força.

Lux – O que é que ainda guarda de quando era criança?
M.P. – O gostar das pessoas, o gostar de sorrir e de ser feliz. Por isso é que as pessoas acham que sou um eterno menino, um miúdo... porque faço de um programa de televisão aquilo que as pessoas querem. Querem que sorria, que seja alegre, bem-disposto, que cante, que não deixe de fazer o programa... Incentivam-me muito.

Lux – Com o programa prestes a fazer três anos, o Marco contou que renovou o contrato e que estará na SIC pelo menos até 2025. É muito reconfortante?
M.P. – É. Qualquer pessoa fica feliz por saber que o seu trabalho é reconhecido, que não dececionou nas audiências. O Marco Paulo não é apresentador, nunca fui...

Lux – Ainda não se sente apresentador?
M.P. – Não... Eu sou cantor! Quando um dia deixar de apresentar o programa volto à atividade que sempre tive. Nunca deixarei de ser cantor por apresentar um programa de televisão. Mas como tem resultado, reconheceram isso e renovaram-me o contrato.

Lux – Quantos dias grava?
M.P. – Dois dias por semana e, como o tempo está a melhorar, vou fazer umas viagens em Portugal. Vou intercalar com os tratamentos e com o programa. Em Portugal, porque gosto de viajar no meu país! Como levei uma vida tão intensa de viagens por todo o mundo, fiquei um bocadinho cansado. Ainda o faço, se for preciso... mas fiquei um bocadinho cansado. Corri a Europa toda, várias vezes, a América do Norte e a do Sul, Austrália... Cantei em todo o lado.

Lux – Tem um projeto para realizar em Mourão, não é verdade?
M.P. – Um dia estava a olhar para tudo aquilo que está ali e achei que poderia fazer de tudo isto (estes troféus, estes discos de ouro e de platina que enchem estas três paredes) uma amostra. Representam quase sete milhões de pessoas que compraram o meu trabalho.

Lux – Um espaço que quer criar...
M.P. – Gostava muito que fosse na terra onde nasci, onde brinquei com as ovelhas, onde cantarolava muito. Ia para a escola, descalço, aos saltos... logo de manhã a cantar. Sobre esse espaço, falei com as autoridades da terra, com a câmara municipal e com o presidente, e quero tentar fazê-lo em vida. Pegar em todos este troféus, em roupa minha de concertos especiais e expô-los na minha terra. Já tenho o local. Toda a verba que ali se fizer pelas entradas vai ser para um fundo para ajudar pais e crianças que, na província, atravessem problemas oncológicos. Quero ajudar com os pagamentos da entrada no museu.

Lux – Há muita vontade para voltar a atuar ao vivo?
M.P. – Claro que há, mas isso não depende só de mim, depende da autorização dos médicos e das datas. Tinha o concerto marcado para o Campo Pequeno, que teve de ser cancelado, e assim que houver luz verde vai-se combinar uma data e fazer-se esse concerto. Quero sentir o “façam barulho”, quero muito ouvir o som dos aplausos.

Lux – Sente falta?
M.P. –  Sinto, as que são aqui no programa são poucas e estou habituado a muitas palmas. E de conviver com as pessoas no final do concerto, de falar com elas... No dia 1 de maio, vou ter uma homenagem muito interessante.

Lux – “Para Sempre Marco”, iniciativa de Tiago Pais Dias, certo?
M.P. – Sim. A SIC apresentou-mo e ele ficou entusiasmadíssimo com o projeto depois de me ter conhecido. É uma homenagem feita a mim, mas não vou cantar, estarão lá outros para o fazerem e vão fazê-lo muito, muito bem!

Lux – Gosta de ouvir as suas músicas cantadas por outras vozes?
M.P. – Depende. Gosto de ouvir as minhas músicas cantadas por outras pessoas, mas têm que as tratar bem, como se fossem um filho. A obra tem que ser muito bem respeitada. Nunca cantei uma versão que achasse que não ia cantá-la bem, para que os autores ou a pessoa que a lançou gostassem. Por isso é que quando gravei músicas do Roberto Carlos e da Amália pedi sempre aos meus produtores e à editora para saberem a opinião dos artistas e dos autores. Felizmente, a resposta foi sempre positiva. A Amália então ficou encantada! E o Roberto falou com alguém da minha editora e apoiou. É o respeito que se tem pela obra e por quem a faz. Tenho duas músicas em espanhol que ainda não lancei, porque ainda não foi dada a autorização para as cantar em português. Já as gravei em espanhol, estou só à espera de uma oportunidade para as lançar.

Lux – Com 55 anos de carreira, o que destaca como pontos altos?
M.P. – Primeiro, foi cantar em Fátima para 100 mil pessoas. Foi no Dia do Doente, na Missa da Esperança, em que fui um dos convidados. E fui duas vezes convidado. Marcou-me muito, porque não estava à espera de chegar ao Santuário e vê-lo repleto de 100 mil pessoas a cantarem comigo o “Nossa Senhora”. E eu pertinho da capelinha, da imagem. A segunda foi ter cantado nas maiores salas de Portugal: Meo Arena, Campo Pequeno, Coliseu do Porto e de Lisboa... Pensei sempre que nunca iria cantar nessas salas e já cantei!

Lux – Ao longo do seu percurso, há arrependimentos?
M.P. – Nada! Não estou nada arrependido de tudo aquilo que fiz e que aconteceu! Estou bem resolvido e com a minha consciência tranquila. Podiam perguntar-me assim: “Não gostava de ter aqui um rancho de filhos ou 
de netos?” [risos] Não teve que acontecer e não aconteceu. Tenho um afilhado maravilhoso, de uma educação, de um respeito por todos... Um grande amigo dos pais e do seu padrinho, sempre preocupado. Se for preciso, vem da Holanda para estar comigo. Vive na Holanda – é professor do conservatório onde andou a aprender – e é por lá que, com certeza, irá ficar. Eu quero que ele se case cá...

Lux – A noiva é portuguesa?
M.P. – Não, é polaca. É a Aleksandra. É uma pessoa encantadora! Fala português – faz questão de falar português connosco – e adora Portugal. Quer vir viver para cá. Isso é meio caminho andado para, um dia mais tarde, tê-los cá.

Lux – O casamento está marcado?
M.P. – Não, mas um dia será aqui!

Lux – Nesta quinta?
M.P. – Sim. Quero ser o padrinho de casamento e do seu primeiro filho. Ele já me disse que sim.

Lux – Ele é uma pessoa especial?
M.P. – É especialíssimo! Não é só bom afilhado, é boa pessoa. É muito fiel às pessoas de quem ele gosta. Quando tirei a mama, precisei que alguém ficasse comigo no hospital e ele ofereceu-se para me acompanhar. Houve um dia em que estavam duas enfermeiras para me dar banho e ele foi ter com elas e disse: “Não se preocupem que eu vou dar banho ao meu padrinho. Ele deu-me banho quando eu era pequenino e hoje sou eu a dar banho ao meu padrinho.” E deu-me banho. Não estava à espera que o meu afilhado fizesse uma coisa dessas. É muito de retribuir com os amigos e com a família, e comigo tem um cuidado muito grande.

Lux – O que é que ainda gostaria de alcançar mais?
M.P. – Tenho uma notícia para dar que é das mais difíceis da minha vida... Como ser humano, como homem, como português, como artista. Muito, muito, muito difícil para mim! Vou dá-la cara a cara, como tudo o que fiz na minha vida.

Lux – Tem a ver com a carreira?
M.P. – Tem, tem a ver com a minha vida profissional. Corri este país todo, levei às pessoas aquilo que muitos não imaginam, e será a elas que tenho que me dirigir. Poderá ser num concerto...

Lux – Será o terminar da sua carreira? Não quer confirmar?
M.P. – Não. É a essas pessoas que quero dizer, olhos nos olhos, o quanto elas foram importantes para mim. Quando eu morrer não quero que chorem. Cantem, cantem muito! Lá nos encontraremos um dia... um dia! 

Este texto foi escrito ao abrigo do novo Acordo Ortográfico
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