O Natal não é quando um homem quiser? por por Filipa Guimarães

O último fim de semana deu o alerta. No domingo, o número de mortos já estava a bater nos 100. Se os efeitos das restrições durante fins de semana estão a resultar, como será se aumentarmos os contactos interpessoais? Por que é que não se adiam ou mudam as celebrações natalícias? Durante o confinamento, os muçulmanos não puderam ir à mesquita no Ramadão, nem os católicos às igrejas nem os judeus às sinagogas. Se o vírus não tem partidos, também não terá religião. Que se ressignifique o Natal, sem lhe retirar a atenção pelos outros. Que em vez de juntar todos, que fiquem em casa. Desde sempre que ouvi que “o Natal era quando um homem quisesse”. Eu também acho. Porquê insistir na festa mais importante para muitos? É o nascimento de Jesus Cristo que se celebra, na aceção mais comum. Mesmo que sem fé, é esse o motivo que ninguém reclama. Nem ávidos ateus. Qual o sentido de estar em família a expormo--nos, e aos outros, a riscos tão elevados? Tenho um amigo que perdeu a mãe e um irmão no espaço de um mês e meio. Já muitos testaram positivo, outros ainda nem sabem como vão ficar. Já acordamos a pensar “quem é que hoje vai morrer”. Uns rezam, outros fazem figas e uns querem lá saber... Se há coisa que a história de Jesus nos conta é a “amar o próximo”. Não significa não ir visitar o avô que está há muito tempo sozinho. Sim, isso parece-me Natal. Não significa convidar um amigo só para jantar. Isso é Natal. Mas não é preciso dar o tal presente no dia exato. As crianças não são burras, percebem tudo se lhes explicarem. Não as usem como álibis. De resto, o Natal para ser feliz necessita de paz. Não de medo. Bom Natal reinventado, é o que desejo a todos nós.

(Crónica publicada na Lux 1077 de 21 de dezembro)