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Nacional
Alta Costura por Filipa Guimarães: 'Como é que a Oprah caiu nisto'
Alta Costura na Lux por Filipa Guimarães, jornalista e escritora Foto: Carlos Ramos
Redação Lux em 25 de Março de 2021 às 18:00

COMO É QUE OPRAH CAIU NISTO? por Filipa Guimarães

A entrevista de Meghan Markle a Oprah Winfrey teve momentos de infantário. A começar pelas perguntas estudadas de tão reputada, seguida e apreciada apresentadora. Porque não me parece que não tenha sido combinada. A resposta da atriz a um episódio passado entre as ainda futuras cunhadas, uma semana antes do casamento sumptuoso com Harry, é reveladora. “É verdade que fez chorar Kate?”, como na sala da diretora da escola. “Não”, responde a alegada vítima de racismo dentro da família do marido: “Foi o contrário.” O motivo foram as flores das damas de honor, explicou a duquesa de Sussex, com ar de desdém. Pelos vistos, houve um pedido de desculpas. Para quê, então, remexer num assunto familiar, em público e a ser visto por milhões? Nem é preciso dizer que o racismo é horrível e algo a combater. Seja numa favela do Rio de Janeiro, em
Washington ou em Londres, mas a entrevista destas “revelações” diz mais sobre quem acusa: a procura de protagonismo. É grave, porque ela lançou a suspeita sobre uma chefe de Estado, por sinal a avó do marido, bisavó dos seus filhos e que soube pelas redes sociais que os duques não queriam privilégios e iam viver para fora. É grave por lançar a suspeita sobre uma família inteira. Não é sustentável acreditar na tese de que a atriz de “Suites”, da Netflix, não saiba o que se passou com a sogra, a tão estimada Diana. Alguém tem dúvidas de que isto vai só no início? É de uma enorme ingenuidade pensarmos que a seguir a este precedente não se sigam mais episódios, insinuações e respetivos desmentidos. O fosso cultural entre os Estados Unidos e a Europa, entre colonizadores e colonizados, brancos e negros, só aumenta com entrevistas assim. Em última análise, é preciso ser-se muito fútil e irresponsável para conceder uma entrevista assim. Numa altura de pandemia e em que existem problemas sociais tão grandes, quando o mundo se debate com verdadeiros problemas de sobrevivência, pobreza e crise económica, o que interessam estas tricas domésticas? Sejamos republicanos ou monárquicos, brancos ou negros, europeus ou africanos, esta entrevista é de um oportunismo e falsidade pornográficos. Como é que uma pessoa inteligente e influente como Oprah Winfrey foi nesta onda populista é que permanece um mistério. Só pode ter sido por dinheiro e por uma visão abusiva do que se passou. Ao menos que oferecesse o chamado “contraditório”. Porém, mais importante do que a crise familiar, a entrevista acaba por ofender quem luta pela igualdade de direitos entre brancos e negros. Não por desavenças entre cunhadas e preconceitos expectáveis numa família conservadora. Assim, não vão lá, meninos...

Crónica publicada na revista Lux 1090 de 22 de março de 2021

Este texto foi escrito ao abrigo do novo Acordo Ortográfico
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