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Nacional
Alta Costura por Filipa Guimarães: 'Pelo menos, conversamos!'
Alta Costura na Lux por Filipa Guimarães, jornalista e escritora Foto: Carlos Ramos
Redação Lux em 11 de Março de 2021 às 18:00

PELO MENOS, CONVERSAMOS!


Já ouviu falar da aplicação Clubhouse? Se ainda não, deve estar por pouco. Até o Bill Gates, da concorrente Microsoft, está interessado nela. De acordo com a App Annie, a entidade que mede o mercado das aplicações móveis, a Clubhouse lidera os downloads nos EUA e na Europa. Já ultrapassou o WhatsApp, o Tik Tok, o
Instagram e o Zoom. Nem sei como é que lá fui parar, mas alguém me convidou e aceitei. Do dia para a noite, e através de uma aplicação chamada Clubhouse, ainda só disponível para iPhones, comecei a ter acesso a “salas” virtuais de conversação. Nos primeiros três dias, fiquei “agarrada” a todo o tipo de conversas, desde aqueles em que se falava só sobre o funcionamento da aplicação a coisas mais sérias, como aceder a minidebates ou fóruns sobre o plano de vacinação ou do tão falado PRR (Plano de Recuperação e Resiliência). Com oportunidade de falar com jornalistas, empresários e políticos. Em três tempos, fiz “amigos” virtuais novos e ouvi vozes que já não ouvia há muito tempo, ou só na TV. Ainda não sei no que é que vai dar isto, mas pelo menos teve o mérito de quebrar o silêncio que reside em minha casa, só entrecortado pela vizinhança, as precárias idas à rua ou pelo telefone. Estar tanto tempo sem falar nem ouvir os outros faz imensa falta. Apesar de não termos a imagem em vídeo das pessoas, dá facilmente para percebermos se são falsas ou não. Por enquanto, o espaço para a mentira e perfis falsos é menor. Depende, como tudo, ao que se vai. No receio de perder pessoas que julgo serem interessantes, comecei a “seguir” algumas pessoas. Estas salas são de audiência aberta (pública ou social, tal como nas outras redes sociais) e, basta clicar numa mãozinha do ecrã, que o(s) moderadores percebem que queremos falar. Tal como na escola, levanta-se a mão. A organização dos temas e a espontaneidade dos participantes é tão variável. Há os “influenciadores“, que têm mais auditório e, depois, há todos os outros, mais ou menos famosos. Temas não faltam: das humanidades à ciência, da política a dicas de culinária, há de tudo. É só procurar os interesses e por alertas. Na primeira semana neste “clube” andei a saltitar entre temas e interlocutores portugueses, franceses, ingleses, espanhóis, brasileiros, pelo menos. Na Clubhouse existe a vantagem, pelo menos para já, de as pessoas não serem malcriadas: ouvem e sabem dar a voz. Se não quiserem estar presentes e com possibilidade de falar, existe uma funcionalidade para sair discretamente, ou “à francesa”. O que constatei, com contentamento, foi que as pessoas estão sedentas umas das outras, de se ouvirem e de falarem. A minha pouca experiência nesta app já me deu para uns serões de gargalhada, para pensar em coisas que nunca tinha pensado e ouvir testemunhos comoventes de pessoas a falarem sobre o que as preocupa. Depressa já se vão criando amizades e combinações, mas perfilam-se também as várias formas de fazer negócio e influenciar a opinião pública. Isto está ainda muito no início, pelo que todos se perguntam sobre os eventuais problemas que possa a vir a ter. Porém, o silêncio começa a ser quebrado e isso só pode ser bom. Mais importante do que parecer, na Clubhouse interessa o que se diz. E ser cordial, o que já vai sendo raro num mundo virtual demasiado marcado pelo insulto e cobardia.

(Crónica publicada na Lux 1088 de 8 de março)

Este texto foi escrito ao abrigo do novo Acordo Ortográfico
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